sexta-feira, 22 de março de 2013

Incidente em Antares


Incidente em Antares
Autor: Erico Veríssimo
Ebook Formato: ePub
Editora: Companhia das Letras


Sete defuntos saem do caixão numa pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul. Início do apocalipse zumbi?

Trata-se de Incidente em Antares, romance de contornos fantásticos de Érico Veríssimo, escrito em 1971.

O incidente fictício ocorre no dia 13 de dezembro de 1963, às vésperas do Golpe Militar, na cidade imaginária Antares, no interior do Rio Grande do Sul. Devido a uma greve de de coveiros, sete pessoas são impedidas de serem sepultadas:

  • Quitéria Campolargo: matriarca da família Campolargo, que morreu de ataque cardíaco;
  • José Ruiz (Barcelona): militante anarquista, morreu de ruptura de um aneurisma;
  • Cícero Branco, o influente advogado, vítima de uma hemorragia cerebral;
  • Erotildes, prostituta, vítima de tuberculose;
  • João Paz, jovem pacifista, torturado até a morte pela polícia;
  • Pudim de Cachaça, o maior bêbado da cidade, envenenado pela mulher;
  • Menandro Olinda, pianista, que se suicidou, cortando os pulsos.


O romance é dividido em duas partes. A primeira conta o desenvolvimento político das duas fações que disputam o poder em Antares: Os Campolargo, e o Vacarianos. A inimizada política e a luta pelo poder percorrem vários acontecimentos da história brasileira, indo de 1830 até a data do incidente. Neste momento as duas famílias estão unidas por uma ameaça comum: o que eles chamam de "ameça comunista": trabalhadores organizados em busca de seus direitos.

A trama da segunda parte, o incidente em si, é fortemente alegórica. Por estarem insepultos, os mortos se erguem e tentam lutar pelos eu sepultamento. E tal qual Brás Cubas, por não ter que dar satisfação de seus atos (estão mortos mesmo) resolvem expor a podridão dos moradores da cidade, sobretudo os poderosos.

Uma excelente leitura, tanto para quem gosta de romances históricos e regionalistas, como para quem aprecia a literatura fantástica.




segunda-feira, 11 de março de 2013

Livraria Limítrofe – O Adeus


Livraria Limítrofe – O Adeus
Autor: Alfer Medeiros
Editora Estronho / Selo Fantas
2ª Edição / 2012
206 páginas


Sinopse: Uma pessoa está sendo admitida num emprego e, ao invés de ser entrevistada, é ela que entrevista, para saber se aceita ou não o trabalho. O livro seria um registro destas entrevistas. O emprego? Ser o livreiro da Livraria Limítrofe, já que o livreiro anterior está se aposentando (daí o epíteto: O Adeus). A razão das entrevistas: o caráter inusitado da livraria.

O primeiro ponto inusitado é que não é o leitor que vai à livraria, é a livraria que vai até o leitor. Não qualquer leitor (pode ser até um não leitor), mas alguém que precisa passar por uma experiência relativa à leitura. E as entrevistas se centram nas pessoas que passaram por esta experiência.

O segundo ponto inusitado é que tudo que o que acontece na livraria é fruto da imaginação de quem entra, desde a aparência inicial (pode ser um livraria cheia da de volumes luxuosos, ou uma barraquinha minúscula), o que acontece lá dentro, as alterações na aparência da livraria decorrentes disto, até o tempo relativo que a pessoa passa entre as paredes (nem sempre são paredes) da livraria.

Por fim a última inversão: ao término da experiência o leitor ganha um livro que guarda uma relação com o que vivenciou e não tem que pagar por isso (porque, segundo o livreiro, ele já pagou, dando uma dose de sua imaginação para manter a livraria).

Alfer Medeiros mostra uma boa habilidade em lidar com o material que comporá o seu romance (não sei se poderíamos chamar assim, já que, no meu ponto de vista, é uma coletânea de contos amarradas por um fio condutor), dada a diversidade de personagens que passarão pela Livraria Limítrofe.

Em primeiro lugar, pessoas diferentes, falam de jeitos diferentes. E todos os capítulos são feitos em primeira pessoa. Adolescentes, jovens, pessoas maduras e velhos, homens e mulheres, pessoas ignorantes e cultas têm não só vocabulário, como jeitos de falar próprios. E Alfer consegue caracterizar isso sem exagerar ou cair na caricatura.

Uma segunda característica é a relação que cada um tem com o livro. Pessoas com pouca afinidade à leitura verão a livraria como pequena e pobre, quem gosta de Ficção Científica a verá como um cenário de Star Trek, quem gosta de quadrinhos encontrará seus heróis ou estará vestindo um de seus uniformes.

A maioria dos visitantes da Livraria Limítrofe leva lembranças boas de lá, mesmo que a experiência não tenha sido agradável, como o executivo que encontra com personagens de livros de autoajuda. Mas alguns leitores não sabem apreciar o que recebem, como a adolescente que não desfrutou plenamente a experiência por tentar comunicar o que estava acontecendo com suas amigas via redes sociais, ou o gamer que sonhou tomar o poder das mãos do livreiro e a mulher ignorante que entrou livraria “por engano” e recusou o livro que recebeu.

Passam pela livraria uma mãe, que se vê encantada com a sua própria capacidade de imaginar e de encantar sua filha; um leitor de quadrinhos; dois amigos com relações diferentes com a leitura; um executivo carreirista; uma adolescente hiperativa; uma mulher em estado terminal; um gamer mal-educado; um editor com medo da tecnologia do livro digital; uma escritora com problemas de encontrar um gênero de acordo com seu talento; uma mulher ignorante que achou a livraria era parte de algum programa de TV com pegadinha; uma mulher em conflito com a Morte; o jovem metaleiro apaixonado por literatura de ficção científica do século XIX; um admirador de histórias de horror que encontra seus autores prediletos; um vampirólogo e, por fim, o autor-personagem.

Cada leitor trará para dentro da livraria sua bagagem cultural e as citações são bem feitas. Alfer não nos conta o nome do escritor ou personagem envolvido na construção do cenário e trama da vivência do “cliente”, mas dá pistas suficientes para que quem tem algum conhecimento do pano de fundo logo identifique de quem se está falando, trazendo um prazer a mais para quem gosta de ler coisas muito variadas.

Por fim alguns, easter eggs, não presentes na primeira edição:

O primeiro é um conto que tem por personagem Adriano Siqueira, o vampirólogo de plantão da Literatura Fantástica, onde ele quase é, literalmente, vítima de sua própria imaginação. Uma homenagem bem feita e com muito bom humor.

O segundo é uma entrevista extra: sobre justamente a feitura do próprio livro onde o autor-personagem também é último dos entrevistados.

E o último é o manual do livreiro limítrofe, onde os objetos mágicos usados pelo livreiro são descritos. Bastante interessante para alinhavar alguns pontos que podem ter ficado soltos ao longo da leitura.

O livro é classificado como juvenil. Como todo livro deste gênero, para ser bom tem que ser agradável também para um adulto. E Livraria Limítrofe de fato é.

Nerd Shop: Livraria Limítrofe. Editora Estronho. Livraria Cultura.

domingo, 10 de março de 2013

Cypherpunks – Liberdade e o Futuro Da Internet


Cypherpunks – Liberdade e o Futuro Da Internet
Autor: Julian Assange
Tradução: Cristina Yamagami
Editora: Boitempo Editorial
Ano: 2012
Formato ePub

Julian Assange (fundador do WikiLeaks) e um grupo ativistas que lutam em defesa do ciberespaço (Jacob Appelbaum, Andy Müller-Maguhn e Jérémie Zimmermann), colocam neste livro que a internet está se tornando um lugar perigoso, prevendo uma grande onda de repressão para populações inteiras.

Isso ocorre porque tudo que trafega está sobre controle de alguém, sejam corporações transnacionais, seja o Estado, numa vasta rede de espionagem, vigiando todos os cidadãos nos mínimos detalhes de sua vida privada. Neste livro ele descreve uma forma de lutar contra isso, através da formação de comunidades que se comunicam através de cripitografia, os Cypherpunks, ou do uso generalizado por qualquer pessoa da criptografia na internet. O termo é a junção das palavras cipher (com o i tornado em y) e punk, para guardar similaridade com o termo cyberpunk, e foi criado nos anos 90, quando surgiram as primeiras discussões sobre privacidade na internet e comunidades deste tipo.

Assange assegura que o livro não é um manifesto, pois, “não há tempo para isso”. Ele coloca a questão em tom de alarme, para nos acordar para o perigo que corremos de vigilância em massa permanente, a censura e a perda da liberdade de expressão e a morte da nossa privacidade.

Leitura obrigatória para quem escreve ficção científica e um alerta importante para aqueles que prezam sua liberdade e privacidade.

Disponível em e-book e em tradicional (papel) na Livraria Cultura.

sábado, 9 de março de 2013

Arnaldo Antunes lê Paulo Leminski

Quem realmente é o Outro?

Arnaldo Antunes lê um poema de Paulo Leminski.


O poema é parte integrante do livro Toda Poesia – Paulo Leminski, publicado recentemente pela Companhia das Letras.

O livro está à venda na Livraria Cultura. 


segunda-feira, 4 de março de 2013

Lilith e o Dia Internacional da Mulher

Lilith - John Collier
Dia 8 de março foi convencionado como Dia Internacional da Mulher e como todas as datas comemorativas, em alguns contextos ela é esvaziada de seu significado. Mulheres recebem rosas com mensagens bonitas e, no dia seguinte, as coisas voltam ao cotidiano.

Para ser um pouco diferente, pretendo neste post, mostrar uma personagem que é bastante significativa no universo fantástico: Lilith.

Lilith é uma divindade babilônica feminina, associada à noite e a lugares desertos. Os relatos nos chegam através da visão hebraica do mito, que o demonizou. Os hebreus tiveram um longo período sob domínio dos babilônios e tendiam a ver os deuses de seus captores como algo extremamente negativo.

Na tradição judaica medieval, Lilith aparece como a primeira esposa de Adão, que se rebelou por não aceitar a dominação masculina imposta por Javé e foi por isso expulsa do Paraíso. Ela foi associada ao desejo sexual e aos sonhos eróticos, considerados maléficos. A Igreja Católica reforçou este mito, colocando Lilith como castradora e lider de uma legião de demônios de natureza sexual, os íncubos (masculinos) e súcubos (femininos). Ela também foi considerada esposa de Lúcifer ou de Samael.
Lilith – Carl Poellath

O interessante é que Lúcifer é associado à Estrela D’alva, aparecendo nos primeiros minutos da aurora e Lilith é um ser noturno e deve se recolher aos primeiros raios de sol. Ela e seu amado só podem ser ver por breves instantes. Esta ideia foi muito bem explorada no filme “O Feitiço de Aquila”.

Lilith começou a ser revista no século XIX, pelos autores românticos, que viam nela o aspecto sedutor e a expressão do desejo sexual feminino, encarado agora de uma forma mais positiva.

Ela representa a parte feminina mais selvagem da mulher, reprimida e impedida se manifestar, para que a organização patriarcal se erguesse. Isso não foi feito racionalmente nem de uma vez, mas ao longo de séculos, muitas vezes de forma inconsciente.

Também a sua libertação se dá pela necessidade da livre manifestação do desejo (de todos, homens e mulheres), reprimido na era vitoriana, fazendo aparecer a mulher fatal, que acende o desejo do homem, mas pode ser perigosa, mostrando o medo de se libertar algo que não se conhece.

Lilith é vista como gênio mal da lâmpada, que está revoltado por ter sido fechado e quer matar seu libertador, apesar de ter o poder de realizar todos os desejos dele. Assim, na visão temorosa, ela terá que continuar contida ou libertada mediante um acordo.

Nós (a maioria dos homens e muitas mulheres) tememos Lilith, por não sabermos quem ela é de fato. Ao tentar analisá-la, ela parece fugir, é arredia e escrever sobre ela parece difícil. Dizem que ela foge das palavras, pois as palavras são um atributo de Javé, o Deus patriarcal. Ensaios acadêmicos não libertam Lilith, apenas tentam analisá-la, dissecá-la, e depois prendê-la no Logos.


Quem quiser escrever sobre ela terá que procura as palavras com auxílio da bruxa (outro termo demonizado), pois a bruxa também tira poder das palavras, através dos encantamentos (em inglês, uma das palavras para feitiço é spell, que também significa 'soletrar'). Um dos motivos da perseguição às bruxas é porque elas dispunham de um poder que rivalizava com o poder estabelecido. Simbolicamente, o poder da palavra, no sentido da palavra ser criadora. Para o poder dominante, bruxas apenas praguejavam ou amaldiçoavam, criando somente o mal. De certa forma este preconceito ainda persiste, colocando a fofoca como um atributo apenas feminino. Um dos sinônimos para fofoca é fuxico, palavra que também significa “trabalho manual feito com retalhos de pano”. Normalmente este trabalho é feito por várias mulheres reunidas.

O caminho é a Arte. Nela domina o hemisfério direito, o lado feminino da mente. Pode-se fazer poesia, escrever um conto fantástico, criar uma música que a retrate ou pintá-la. Ou fazer um encantamento.

Muitas vezes Lilith é representada como um vampiro, um ser que tem a mesma ambiguidade que ela. Na tradição hebraica, às vezes ela é chamada de “bebedora de sangue”, um insulto associado à proibição judaica de se abster de sangue.

O vampiro representa a sedução e o perigo juntos. Alguém que oferece algo desejável, mas que tem um alto preço. A mesma imagem de Lilith. Ela oferece o prazer livre de culpa e o preço sermos expulsos do Paraíso. Psicologicamente nos tira do sonho infantil e nos coloca na realidade. Por isso Lilith é associada à serpente que tentou Eva. Perdemos o Paraíso, mas ainda que aqui seja "o Vale de Lágrima", aqui podemos evoluir.

Fugidia, nos assustando, ainda assim deve ser libertada. Quando ela vier à luz em sua totalidade veremos o quão bela é e podemos finalmente respirar aliviados.